NOTA PÚBLICA DE RETRATAÇÃO

Nós, Coordenação Nacional do LesboCenso, viemos a público, respeitosamente e com reconhecimento intelectual e político, retratar-se com a comunidade trans e todas, todes e todos apoiadoras e apoiadores de nossa iniciativa. Acreditamos que isto se faz urgente considerando as diferentes manifestações de racismo e transfobia constituintes e estruturantes de nosso cotidiano, as quais não podemos, em qualquer ocasião, deixar de reconhecer e de somar na luta pela erradicação destas violências. E, por enfrentarmos críticas e boicote de grupos trans-excludentes desde o início do projeto, por assumirmos o entendimento de que sapatão podem ser trans e cis, é que vimos em nota nos retratar e reiterar nossa disponibilidade de aliança com corpos e corpas trans e travestigêneres, em consonância com nossa posição política.

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Sobre o LesboCenso

O LesboCenso Nacional é uma iniciativa do movimento lésbico nacional que tem  o intuito de fazer o mapeamento sobre lésbicas e sapatão, de diferentes gerações, raças e etnias, corporalidades e classes sociais. O nosso objetivo é elaborar e refletir sobre experiências e dados a respeito de quem somos, onde estamos, buscando possibilidades de acesso a direitos para lésbicas e sapatão trans e cis.

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Sobre o instrumento de coleta de dados

 

Para realização do estudo, organizamos um questionário com mais de 80 perguntas, que foram submetidas a um pré-teste conforme indicam as boas práticas científicas. No entanto, assim como outros espaços da nossa sociedade, o LesboCenso também está permeado pela desigualdade estrutural do racismo e da transfobia.  E isso se torna visível em uma das questões que não foi cuidadosamente revisada e foi publicada reproduzindo transfobia. No "Eixo de Violência", existe uma questão que pergunta “Quem praticou a violência contra você?", tendo como uma das alternativas “pessoas trans”. Nós partimos do pressuposto que tanto pessoas cis quanto pessoas trans podem ser agentes de violência, mas ao colocar uma opção evidenciando apenas pessoas trans e não evidenciando pessoas cis na mesma medida, acabamos por violentar e estigmatizar ainda mais as pessoas trans. O que se resulta disso demonstra o quanto ainda temos para assimilar e praticar valores de justiça, equidade e inclusão entre nós.

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Nosso #ERRO a ser retratado

 

Retratar é condizente com uma conduta ética na comunidade científica, bem como no movimento social lésbico e sapatão, ao reconhecer erros produtores de estigmatização e reprodutores de hierarquizações sociais, ainda que estas não devam ocorrer, especialmente em estudos sobre diversidade e comunidades periféricas. No entanto, é também constituinte da pesquisa social o amadurecimento intelectual no processo e no curso do desenvolvimento do estudo. Esperamos, nesta nota, explicitar o reconhecimento do erro e indicar os caminhos de retratação a serem realizados nos momentos que se desdobrarão. 

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Indicamos as seguintes ações de Retratação Pública

 

Reconhecendo nosso erro e nos responsabilizando em retratar a violência cometida, realizamos em dezembro uma reunião entre a coordenação do projeto e pessoas trans que responderam ao questionário e se disponibilizaram - mesmo com a violência sofrida - a construir conosco alternativas. Foi consensuado nesta reunião que, além de emitir essa nota de retratação, seria incluído um capítulo sobre as experiências e vivências trans lésbicas e sapatão, abordando não apenas as respostas recebidas de trans lésbicas e sapatão - que se disponibilizaram a responder -, mas também sobre todo este processo para que não haja apagamento também de nossos erros enquanto equipe coordenadora. Além disso, foi consensuado que faríamos eventos online de formação política sobre cisgeneridade, heteronormatividade e lésbicas e sapatão trans, e que construiremos em conjunto as novas etapas do projeto já que o LesboCenso não se resume apenas a esta coleta de dados. Após esta reunião, a coordenação do LesboCenso Nacional buscou formas de alteração desta questão sem inviabilizar a pesquisa do ponto de vista do rigor ético-científico oficial. Foi verificado que é possível retirar a única alternativa “pessoas trans" sem inviabilizar o questionário inteiro já respondido por mais de 12 mil pessoas. Cabe ressaltar que há um aviso de gatilho no termo de consentimento apresentado antes do formulário se abrir. Neste mesmo termo, informamos que qualquer impacto na saúde mental que alguma questão desta pesquisa tenha, seja para quem for, nós disponibilizamos atendimento psicológico por meio de contato direto de uma profissional de Psicologia.

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Por que o LesboCenso Nacional permanece sendo fundamental para nossa comunidade?

 

O LesboCenso Nacional existe primordialmente em decorrência da ausência de dados científicos sobre nossa população. Se não fosse a Lesbofobia de Estado expressa na política nacional de levantamento de dados populacionais no Brasil, que apenas na década passada incluiu uma menção distante em relação a dados de conjugalidade ligados à relação da pessoa respondente na MUNIC (Pesquisa de Informações Básicas Municipais) do IBGE, talvez não precisássemos de maneira autônoma, coletiva e com escassez de recursos desenvolver um projeto da envergadura do que se propõe o LesboCenso Nacional, que só tem acontecido até o momento em função de nosso ativismo e da adesão de tantas pessoas e organizações parceiras. É importante ressaltar que essa estratégia do IBGE exclui, pois decorre da formalização legal da união estável entre pessoas do mesmo gênero. Ou seja, lésbica e sapatão que residem sozinhas ficam excluídas do processo, por exemplo.

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Reiteramos aqui que a Coordenação do LesboCenso Nacional se coloca em aliança às sapatão, lésbicas e lesbianas em sua multiplicidade de gêneros e corpos reforçando que não nos aliamos a condutas trans-excludentes.

 

 

A nossa luta é por um mundo mais justo, sem racismo, sem transfobia e sem machismo a partir de um projeto anticapitalista, anticapacitista, anticissexista e antiLGBTIfóbico.

 

28 de Janeiro de 2022

Coordenação Nacional LesboCenso

 

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